quinta-feira, 22 de maio de 2014

CARAMURU- UMA HISTORIA A SER CORRIGIDA

Em diversas ocasiões este blog tem se reportado à figura de Diogo Álvares Correia na história da Bahia, principalmente quando ligam este fidalgo português à lenda de Caramuru, resultado de um poema épico feito pelo Frei José de Santa Rita Durão denominado justamente de Caramuru, escrito no ano de 1781, ou seja, 233 anos de hoje e 271 anos após o suposto ocorrido.



Logo, pelas circunstâncias, só poderia ser uma criação na imaginação do frade, absolutamente fora de qualquer realidade e às vezes lógica.

Apesar disso, ensina-se nas escolas, escreve-se em revistas e jornais e se aceita até em determinados Centros Históricos, como sendo uma verdade incontestável.

Ninguém tem o cuidado de dizer que se trata de uma ficção ou de uma lenda, inserida no contexto de um trabalho literário.
Caramuru verde

Não nos incluímos nesse rol, muito pelo contrário. Consideramos o caso um embuste que precisa ser corrigido.

Para começo de conversa, há de se contestar ter havido o próprio naufrágio nas costas do Rio Vermelho. A primeira desconfiança tem como base o fato de que Gabriel Soares de Souza, cronista mais próximo daquela época, nunca ter comentado a “mariquita”, ou seja, o naufrágio dos franceses, segundo a língua tupi-guarani nas costas bravias do Rio Vermelho.

Modernamente, nas Atas dos IV Cursos de Verão de Cascais, abordou-se o tema “Mito e Símbolo na História de Portugal e Brasil, Câmara Municipal de Cascais-1998

O texto é o seguinte:

“Não há qualquer segurança a respeito da data de chegada à Bahia de Diogo Álvares. Os documentos da época são vagos a respeito, alguns contraditórios, o que leva os historiadores a adotarem opiniões diferentes, segundo a fonte em que se baseiam. A maioria das fontes conduz para os anos imediatamente posteriores a 1500, algumas, entretanto, apontam para a década de 1530. Embora não se costume levantar dúvidas a respeito da condição de náufrago de Diogo Álvares – de tão  repetido, parece hoje “incorporado ao personagem” o fato é que ela não é comprovada. Gabriel Soares de Souza refere-se a um naufrágio, porém ocorrido nas costas da Bahia durante uma viagem entre Ilhéus e Vila Velha, em companhia do donatário Francisco Coutinho. A narrativas do Pe. Simão de Vasconcelos, que dá Diogo como náufrago numa viagem desde Portugal, omite suas fontes, mas documentos posteriores repetiram a informação, também sem indicarem a origem. No século XVII, o poema épico de Santa Rita Durão dedica-se ao episódio.

Do naufrágio um movimentado, heroico e trágico canto, ligou definitivamente Caramuru à condição de náufrago; isto não foi reforçado pela iconografia que reproduzia fartamente o episódio. Permanecem, contudo, outras probabilidades também sem confirmação documental: a de Diogo Álvares ter sido um entre vários degredados então abandonados no litoral brasileiro, com o objetivo de ai aprender a língua e costumes locais para depois os transmitirem aos portugueses; a de ter sido tripulante de uma das primeiras expedições enviadas ao Brasil, decidindo, por vontade própria, permanecer em terra, como o fizeram outros portugueses; e a de ter sido um dos diversos judeus que, expulsos do Reino em 1496, buscaram a América. Embora ela seja provável, não há segurança acerca dessa naturalidade. Há certeza apenas quanto à nacionalidade portuguesa de Diogo Álvares, atestada por testemunhas da época. Alguns autores registram o nome completo como Diogo Álvares Correia.”

Trabalho icnográfico sobre Caramuru

O que é verdadeiro e certo é o fato de que, Diogo Álvares Correia foi interprete e mediador junto aos índios. Seu nome, os serviços que prestou à Coroa e à Igreja e sua descendência foram aplaudidos na correspondência civil e religiosa enviada à época da Bahia. Tomé de Souza recompensou-o com mercês e com recomendações sobre sua pessoa ao rei e o Pe. Manuel da Nóbrega que com ele conviveu, o elogiou em mais de uma carta. Ao morrer, Diogo deixou metade de sua terça à Companhia de Jesus. É provável que, após o inicio da colonização sistemática, Caramuru tenha vivido tanto nos núcleos urbanos quanto entre os indígenas. Tudo indica que faleceu na Bahia, havendo duvida quanto a data: teria sido no ano de 1557.

Também é interessante observar que o episódio da arma de fogo não foi referido por Santa Rita Durão e sim pelo Padre Simão Vasconcelos em obra à parte.  Venhagem, também cronista, foi o primeiro a duvidar do episódio e ironizá-lo.

 Aliás, não é preciso recorrer a cronistas e afins para se notar como é desconexa quanto descabida a obra de Santa Rita Durão no que se refere à lógica e ao bom senso.



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