Como já se disse, no mercado se commercializavam todos os tipos de mercadorias: cereais, cerâmicas, verduras, peixes, carnes, farinha, artesanatos, confecções, grãos, etc. Possuía diversos pequenos restaurantes com destaque para o de Maria de São Pedro. A juventude da época, vinda dos clubes e das casas noturnas existentes na Cidade Alta (Fantoches, Rumba Dancing, Tabaris,) costumava comer um famoso mocotó que todos os restaurantes faziam de madrugada. Era uma festa gastronômica que se prolongava por vezes até as 9 horas. Os que moravam para os lados de Itapagipe, exaustos, mas fartos, pegavam o bonde na porta do Elevador Lacerda. Mais tarde, com o advento dos ônibus, usavam o abrigo existente ao lado. Enquanto isto se formavam as rodas de capoeira. Reparem os versos adiante alusivos ao fato:
"Tava no Mercado Modelo Modelo
Esperando o amanhecer, ai auê
Tava no Mercado Modelo
Esperando o amanhecer, ai auê
Muita gente esperando, perguntando
Camará que vai fazer, ai auê
Muita gente esperando, perguntando
camará que vai fazer, ai auê
Eu respondo, eu sou capoeira
e maculelé, ai auê
Eu respondo, eu sou capoeira
e maculelê, ai auê
Ai ai auê, alê!
Ai ai auê"
O restaurante de Maria de São Pedro era o mais famoso. Nascida em Santo Amaro da Purificação, a famosa quituteira começou seu negócio na antiga Feira do 7, isto é, uma feira que existia em frente ao 7º Armazém das Docas.
Tinha uma única mesa e seus fregueses eram os chamados estivadores. Seu tempero era maravilhoso. Foi criando fama. Mudou-se para o antigo Mercado Popular onde é hoje o Mercado do Peixe, ao final da Ladeira da Água Brusca. A Feira de Água de Meninos ficava em frente.
Já nessa época grandes boêmios e intelectuais de Salvador começaram a freqüentar o pequeno restaurante da grande quituteira, com destaque para pessoas como o jornalista Odorico Tavares do antigo Diário de Noticias e o escritor Jorge Amado, sempre à procura de novidades para seus maravilhosos livros.
Na década de 1940, Maria de São Pedro, mudou-se para o antigo Mercado Modelo. Em seu restaurante recebeu figuras badaladas de todo o mundo. O ator Orson Welles, o poeta Pablo Neruda, o filósofo Jean Paul Sartre. Jorge Amado continuava freguês, agora se fazendo acompanhar por Calazans Neto e Caribé, seus grandes amigos.
Também marcou presença o Conde Matarazzo e sua esposa, Dona Yolanda. Convidaram-na para preparar o banquete da festa dos 400 anos de fundação da capital paulista. Maria de São Pedro viajou de avião. Levou ajudantes e uma tonelada de dendê, camarão, pimenta, gengibre, coco, castanha, panelas de barros e colheres de pau.
Conta-se que já no palácio, ao tempo em que começava a preparar as comidas, um “chef” tentou dar palpite. Maria não se fez de rogada. Chamou dona Yolanda e disse: “ou este gringo ou eu”. Dona Yolanda não pestanejou. Botou o gringo para fora. Isso nos conta Odorico Tavares.
Mas, quis o destino que em certo dia, fatídico para as tradições da Bahia, agosto de 1969 (tinha que ser nesse mês), o maravilhoso Mercado Modelo pegava fogo. As imagens são impressionantes.
Não sobrou nada internamente. Somente as paredes se mantiveram em pé. Poderiam ser mantidas. Fazia-se nova estrutura. Não era uma boa idéia? Mas, não. Dias depois, tratores trataram de derrubá-las impiedosamente. Havia muitos interesses em jogo. Naturalmente o assunto gerou uma grande polêmica. O Professor Zezé Catharino, figura magnífica, advogado de grande fama, grande tenista, em entrevista, comentou: “a queima do Mercado Modelo foi fruto de uma ação incendiária proposital”. Já outro advogado, Amâncio José de Souza, também em entrevista, comentou: “dizem que queriam queimar o Mercado Modelo para limpar a área, porque ele era um monstrengo e dificultava o acesso à Avenida do Contorno. Sob esse ponto de vista eu, como cidadão, achei que melhorou muito, agora dizer que foi proposital, aquilo foi no governo – salvo engano – de João Durval, mas que eu saiba não há nenhuma prova conclusiva desse fato (...)."
Pelo que se nota, há controvérsias a respeito. Muita coisa na Bahia já foi incendiada. Os trapiches, por exemplo, que empatavam o aterro do Porto e a construção das novas avenidas.
No bairro do Comércio existiam, no século passado, dois pequenos mercados municipais: Santa Bárbara e São João, situados respectivamente, nos terrenos onde hoje se localiza o Edifício Centenário, pertencente à Aliança da Bahia, e a Rede Ferroviária Federal, na Rua Portugal. Desde 1878, pretendeu-se construir um novo centro de abastecimento na cidade baixa. Em 12 de agosto de 1906, o governo aprovou os estudos definitivos das obras do porto, com exceção das modificações relativas à Doca do mercado, que poderia ser transferida para a área do ex – arsenal da marinha.
A construção do Mercado Modelo foi concluída no final de 1912. Tratava-se de um edifício retangular, envolvidos por marquises, estrutura metálica importada, com cobertura constituída por três detalhes superpostos, de modo a permitir boa ventilação e iluminação natural.
E no espaço que foi o grande mercado, a Marinha estendeu sua posse, ela que já se encontrava nas proximidades com sua Escola de Aprendizes e ela que era a verdadeira proprietária daquela área por questões legais.
Os remanescentes dos peixeiros que atuavam na rampa do mercado, ainda tentaram continuar a negociação do pescado na área, mas foram proibidos. Parece que também ficou proibida a atracação dos antigos saveiros no local. Também não era para menos! Foi construído um heliporto numa das extremidades da rampa e, certamente, os mastros dos saveiros dificultariam as operações de pouso e decolagem.
No dia do incêndio do velho Mercado, manhã de 1º de agosto de 1969, acorri ao local empunhnado minha inseparável yashica e em dez slides coloridos (na época não se faziam fotos coloridas) pude registrar toda tragédia. Sim, se dizia na o prefeito teria aproveitado para demolir o prédio e com isso unir a av. da FRança com a Contorno. Que o mercado poderia ser reerguido ninguém que viveu a época, tem dúvida, pois a estrutura permaneceu intacta somente vindo abaixo o telhado e as mercadorias das barracas. Com isso a Bahia perdeu um monumento histórico, mas Salvador deus aos automóveis mais mobilidade. Em meu blog marcosnogueira-2.blogspot.com também fiz postagem sobre o assunto.
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