A inauguração do porto de Salvador mudou toda uma ordem sócio-econômica de uma cidade e o seu próprio destino. Durante quase todo o século XVIII, a capital baiana era considerada uma cidade cosmopolita, dentro dos padrões da época. Chegou a ser tida como uma potência no Hemisfério Sul.
Fileiras de prédios maravilhosos foram sacrificadas. Ali pulsava a Bahia econômica. Eram mercados e trapiches que movimentavam a economia de uma cidade. Bancos, escritórios de importadoras, escritórios de advocacia, seguradoras, davam o apoio logístico.
Não se diria que, de uma hora para a outra, a coisa mudou, desde que a idéia do porto vinha se arrastando desde 1584. Haveria de chegar um momento que ele seria construído, mas a esperança dos trapicheiros era que isto não ocorresse e lutaram muito para adiar essa concretização.
Sabiam eles que no bojo do projeto do porto havia uma condicionante desastrosa para os seus interesses, qual seja, a cobrança de taxas alfandegárias que se dizia seriam na ordem de 40%. Para quem não pagava nada, esse percentual representava uma pá de cal em cima do sistema econômico então existente.
Uma das bandeiras dos que eram contra a construção do porto e a cobrança das taxas aduaneiras, era de que as mesmas foram pensadas com vistas a beneficiar os estados do sul que começavam a se industrializar. Com a diminuição das importações e até mesmo quase a sua supressão, as indústrias instaladas a partir do Rio de Janeiro e São Paulo, haveriam de prosperar quase repentinamente com o crescimento do mercado interno.
Faz-se então o porto. A modernidade, a acessibilidade, a cobrança das taxas aduaneiras eram em verdade, a grande finalidade do novo equipamento? Muitos setores diziam que não. Os objetivos eram outros. Envolvia interesses internacionais. Dizia-se que o porto de Salvador fora construído para assegurar o abastecimento de água potável, descanso ou reparo aos navios a caminho do Oceano Pacífico, o chamado Caminho das Índias. O interesse seria mais de terceiros do que da própria cidade.
Por exemplo, a nível de exportação teve importância apenas razoável com relação ao açúcar, o couro e a madeira. Durou pouco tempo! O açúcar que era básico teve seu ciclo encerrado. Restou apenas o tal “Caminho das Índias”, mas por azar, esse também terminou quando se abriu o Canal do Panamá, tornando-se inviável o Porto de Salvador para os navios que aqui vinham se abastecer. Só um e outro! Lá era mais conveniente, porque mais perto de diversos destinos.
Outro ponto um tanto quanto discutível da construção do Porto de Salvador onde efetivamente ocorreu, foi o câmbio da navegação à vela pela navegação a vapor. Os trapiches acabaram. Os saveiros ficaram sem função. Todo o recôncavo baiano sofreu na carne. As cidades em torno estacionaram economicamente. As ilhas também. O bairro do Comércio perdeu a atmosfera internacional que possuía.
Diz-se que a Cidade de Salvador deu as costas para o mar, o que é verdade. Isso tem a ver com as cargas e o ambiente social. Havia um passível ambiental. O porto era um lugar imundo. Era comum jogar no mar restos de cargas avariadas de alimentos. Crescia a população de ratos. No campo social, a atividade portuária era exclusivamente masculina. Isto incentivou a criação de prostíbulos nas proximidades. Virou “barra pesada” associado ao submundo de crimes, drogas e contrabando. Por outro lado, a topografia da cidade agravou a divisão, contribuindo não só para separar os dois setores da cidade, mas para sujar ainda mais a parte baixa da mesma.
“Os shopping centers antigos eram locais de encontro social e feiras ao ar livre. Vitrine para a modernidade, mostravam desde as tendências de moda de Paris e as notícias do Velho Mundo, até as especiarias, alimentos e produtos manufaturados. A Colônia via no comércio mercantilista uma porta de entrada para o progresso, fruto das grandes transformações socioeconômicas pelas quais passava; industrialização, expansão demográfica e reformas urbanas”. (Comentário da época).
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